segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Por que jornalistas deveriam saber o básico de Física e outras ciências?

É de minha sincera opinião que conhecimento nunca é demais. Inclusive aquele conhecimento que aparentemente não nos acrescenta nada, por não integrar o currículo de nossa formação, ou futura formação profissional.

O conhecimento básico de ciências, principalmente para jornalistas que escrevem sobre o tema, evitaria alguns erros crassos em notícias, como a que apresentarei a seguir.

No dia 19 de outubro de 2010, a agência EFE publicou uma notícia, reproduzida por diversos órgãos brasileiros de imprensa, sobre uma mudança na altitude da órbita da Estação Espacial Internacional (ISS). Eis a reprodução de um trecho do referido texto:
” (…) ‘como resultado da manobra, a velocidade de voo da estação aumentará em 0,5 metro (sic) por segundo’ e que a altura média da órbita terá sido elevada em 900 metros até os 353,3 quilômetros.”
Ora, o conhecimento básico da 3.ª lei de Kepler, ou Lei Harmônica, levaria qualquer jornalista atento e cuidadoso a consultar um especialista antes de publicar, ou republicar, esse trecho. Segundo essa lei, para um dado corpo central – a Terra, no caso da ISS -, o quadrado do período orbital e o cubo do semieixo maior da órbita são diretamente proporcionais.

T2 = k R3.

Isso significa que, quanto maior o raio médio da órbita, maior será o período orbital e, consequentemente, menor será a velocidade de translação do corpo. Portanto, o aumento da altura média da órbita em 900m levaria a uma diminuição da velocidade de voo da estação.

Podemos demonstrar isso facilmente, lançando mão da Lei da Gravitação Universal de Isaac Newton. Consideremos centrípeta a força de atração gravitacional exercida pela Terra sobre a ISS:


Consideremos:
  • Constante gravitacional universal: G = 6,67 × 10−11N m2/kg2;
  • Massa da Terra: M = 6,0 × 1024kg;
  • Raio médio da órbita da ISS: R = RT + h, onde RT é o raio da Terra, 6,4 × 106m = 6 400 × 103m, e h é a altura da órbita.
Segundo a notícia, após a elevação a altura da órbita passou a ser h2 = 353,3 × 103m. Então, antes da elevação, a altura da órbita era h1 = 353,3 × 103 − 0,900 × 103 = 352,4 × 103m. Então,
  • Raio médio da órbita antes da elevação: R1 = 6 400 × 103 + 352,4 × 103 = 6 752,4 × 103m;
  • Raio médio da órbita após a elevação: R2 = 6 400 × 103 + 353,3 × 103 = 6 753,3 × 103m.
Calculemos, então, a velocidade da ISS antes da elevação da órbita:


Do mesmo modo, a velocidade da ISS após a elevação da órbita é dada por:


Assim, fica evidente que a variação da velocidade foi:


Portanto, como explicado anteriormente, a elevação da órbita implica uma diminuição da velocidade, com valor compatível ao apresentado pelo texto da notícia.

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